A Flexibilidade dos Sistemas de Potência e as Plantas de Geração Integradas Eólico-Fotovoltaicas
Nota Técnica
Autor: ESC Engenharia
A flexibilidade é a capacidade de um sistema elétrico de potência de gerenciar de maneira confiável e econômica a variabilidade e a incerteza da demanda e do suprimento em todas as escalas relevantes de tempo, desde garantir estabilidade instantânea do sistema de potência até dar suporte à segurança do suprimento a longo prazo (IEA, 2019).
No cenário brasileiro, as usinas hidrelétricas (UHE) e termelétricas (UTE) são os recursos primários de flexibilidade do sistema elétrico. Isto se deve porque, de modo geral, é confiável contar com as energias primárias das UHEs e UTEs nas rotinas diárias da operação, sendo, portanto, possível planejar seus despachos. Destaca-se, porém, que já é significativa na matriz elétrica brasileira a participação das centrais de geração eólicas (CGE) e usinas fotovoltaicas (UFV). Essas fontes alternativas (FAs), porém, se analisadas isoladamente, agregam pouca flexibilidade, principalmente se considerado o suprimento de longo prazo, quando comparadas às fontes convencionais (FCs), isso em decorrência da baixas previsibilidade de seus despachos, herança da natureza estocástica das suas energias primárias.
Quando essas CGEs e UFVs, no entanto, são analisadas levando-se em conta seus perfis horários particulares de geração, verifica-se impacto positivo na flexibilidade do subsistema regional no qual essas fontes estão inseridas, isso em decorrência da complementaridade energética existente entre as variáveis velocidade do vento e irradiação solar/temperatura. A Figura 1 apresenta as curvas de geração horária, ao longo de 14 dias, das CGEs e UFVs do Nordeste do Brasil e os destaques em vermelho chamam atenção para a ação das UFVs dando suporte regional em momentos de “afundamentos” de geração das CGEs, um claro melhoramento da flexibilidade por efeito portfólio dessas fontes não controláveis.
Enquanto o efeito portfólio das fontes alternativas é fenômeno natural, passivo, presente na integração de CGEs e UFVs, independentemente da distância geográfica entre os sites de geração, em decorrência da correlação entre o comportamento do vento, irradiação solar e temperatura, quando essas fontes são integradas como usinas associadas eólico-fotovoltaicas ou usinas híbridas eólico-fotovoltaicas (EPE, 2018a; 2018b), a flexibilidade pode ser agregada de forma ativa, empregando-se controle da operação.
Uma estratégia típica de controle pode empregar a geração da UFV como variável de compensação de fechamento do balanço carga-geração por meio da operação dessa fonte sob modos específicos: (a) sempre programada para gerar a sua máxima potência e rejeitar geração (“curtailment”), (b) sempre programada para gerar a sua máxima potência, despachar para baixo ("downward"), e (c) programada para operar sob geração reduzida de modo a dispor de uma reserva para despachar para cima ou para baixo ("full flexibility"). A Figura 2 apresenta um outro aspecto da flexibilidade conferida ao sistema de potência, destacada pela IEA, por meio dos modos de despacho curtailment, downward e full flexibility: os ganhos nos custo de produção.
Da análise da figura vê-se que quanto mais versátil é o controle do despacho efetuado (full flexibility), mais se pode usufruir com a associação ou hibridização de CGEs por UFVs em termos de redução dos custos de operação. Quando menos versátil, caso das UFVs sempre inseridas (must-take), mais limitados são os ganhos nos custos de operação, mas ainda assim há benefícios adicionais à flexibilidade por efeito portfólio com o aumento da participação das UFVs em associação/hibridização por UFVs.
De fato que a integração de UFVs a CGEs como usinas associadas ou híbridas se mostra como um importante recurso de flexibilidade para os sistemas de potência, seja pelo efeito portfólio, seja pelas estratégias de despacho descritas, mas para a potencialização da aplicação da tecnologia no Brasil, a ESC Engenharia destaca alguns pontos relevantes no estudo em assunto: (a) embora o cenário regulatório brasileiro atual ainda traga insegurança aos empreendedores referente a operação associada ou híbrida de CGEs e UFVs, principalmente sobre os temas: garantia física, do CUST/CUSD, da medição de faturamento e da outorga; essas indefinições já estão mapeadas pela EPE, através de inúmeros relatórios e notas técnicas, e pela ANEEL, por consulta pública sobre regras para usinas híbridas, realizada em Jun/2019 (ANEEL, 2019), (b) a garantia da versatilidade das estratégias de despacho apresentadas exige um grau relevante de automatização das plantas eólicas e fotovoltaicas envolvidas, resultantes de associação ou hibridização, uma vez que muitas variáveis devem ser supervisionadas e controladas para garantir um sistema de controle de despacho assertivo e (c) uma atenção especial deve ser dada no projeto de adequação dos sistemas de controle de usinas associadas ou híbridas resultantes da conversão de CGEs e UFVs pré-existentes, pois quando pensadas como uma única usina associada ou híbrida, soluções específicas também precisam ser construídas, de modo que deve ser avaliada relação custo-benefício de uma adequação muito invasiva ou a proposta de um novo sistema de controle.
REFERÊNCIAS
(IEA, 2019)
https://www.iea.org/reports/status-of-power-system-transformation-2019
(EPE, 2018a)
(EPE, 2018b)
(ANEEL, 2019)