Framework para Desenvolvimento Automatizado e Padronizado de Aplicação de Alto Desempenho para Supervisão de Subestações Elétricas

Autores: Adônis Belo França (SM Energy), Renata Teixeira Fernandes (SM Energy), Luciana Machado Lins (SM Energy), Vitor Tabosa de Vasconcelos (ESC Engenharia), Saulo Soares (ESC Engenharia).

1 INTRODUÇÃO

A O&M de subestações tem como principal objetivo garantir a disponibilidade e segurança do sistema elétrico. Para alcançar esse objetivo, é fundamental contar com informações e dados operacionais de tempo-real e históricos confiáveis, para apresentá-los em IHMs (Interface Homem-Máquina) que sejam capazes de prover os melhores subsídios para tomadas de decisões das equipes de engenharia. Nesse aspecto, a supervisão torna-se essencial não apenas para o controle de qualidade, mas também para preservar a confiabilidade operacional do sistema elétrico.


Os sistemas SCADA de alto desempenho são fundamentais, pois como afirma-se em [1], o desenvolvimento destes sistemas se fundamenta em estudos nas áreas de design, psicologia e ciências cognitivas com o objetivo de mostrar de forma intuitiva aos operadores as informações necessárias de acordo com o monitoramento da planta, gerando um alto nível de Consciência Situacional ao operador e uma rápida detecção de situações anormais. No entanto, desenvolver esses sistemas pode ser um processo longo e passível de erros, quando desenvolvidos sem os fundamentos técnicos e premissas necessárias a um desenvolvimento de excelência.


Em subestações pertencentes às redes de transmissão e distribuição, a criação de configurações de dados e telas podem apresentar quantidades elevadas de medições supervisionadas, que por sua vez, são distribuídas em várias telas, pop-ups e funcionalidades intrínsecas da aplicação. Em decorrência dessa magnitude de desenvolvimentos, problemas como: a falta de qualidade dos dados, falta de padronização de telas, baixo nível de confiabilidade do operador no SCADA, erros operacionais e alto custo associado à baixa flexibilidade na atualização das aplicações do Sistema SCADA, podem surgir como fatores de um desenvolvimento falho, ou mal executado.

2 REVISÃO DE LITERATURA

Em [2] se afirma que a O&M de subestações inteligentes são muito diferentes de subestações convencionais. Subestações inteligentes prestam mais atenção à modelagem e configuração unificadas, o que impõe maiores exigências aos softwares auxiliares das subestações. Dessa forma, Sistemas SCADA utilizados para O&M de subestações inteligentes devem possuir uma maior confiabilidade e padronização do sistema. Em [2] é proposto um novo esquema para sistemas inteligentes de automação de subestações, que aplica integração vertical de intervalos, para reduzir a implementação de funções de proteção e monitoramento, adotando protocolos de redundância paralela de rede para melhorar a confiabilidade e padronização da transmissão de informações na estação.

Em [3] propõe-se uma metodologia utilizada no desenvolvimento de aplicações de software SCADA. Essa metodologia, denominada Lean Automation (LA), baseia-se no conceito de um componente, que se torna um objeto SCADA, incluído na aplicação com um único clique, e contém todas as funcionalidades voltadas para o monitoramento e controle do processo, ou parte dele. Em [4], são discutidos alguns dos problemas atuais mais desafiadores do projeto do sistema SCADA e apresenta um conceito de um SCADA de propósito geral destinado a aplicações de alto nível. O trabalho apresenta a proposta de uma nova arquitetura adaptada e aperfeiçoada para atender as necessidades do mercado moderno.


É possível observar nos artigos revisados que o processo de desenvolvimento de sistemas SCADA de alto desempenho enfrenta diversos desafios que podem ser muito custosos e demorados. Soluções que possam automatizar a criação de configurações de sistemas SCADA permitem diminuir o tempo de desenvolvimento dos sistemas, reduzindo custos de produção e principalmente as possibilidades de erros humanos nos desenvolvimentos. O uso de uma metodologia para padronizar a geração das configurações permite minimizar os erros associados aos seus desenvolvimentos, aumentando a eficiência e confiabilidade do sistema de supervisão.

3 SOLUÇÃO PROPOSTA

Esse trabalho propõe como solução um framework para a geração automática das seguintes configurações necessárias e comuns aos Sistemas SCADA de alta performance: (1 - Configurar a aquisição e distribuição de dados, 2 - Configurações de alarmes 3 - Endereçar os históricos de bancos de dados 4 - Efetuar as criações de telas). Dessa forma, é possível definir uma padronização de qualidade para o Sistema SCADA, reduzindo os tempos de desenvolvimento dos sistemas e os erros associados aos seus desenvolvimentos, assim elevando a eficiência do processo, e aumentando a confiabilidade da aplicação para a O&M.


Por conseguinte, com o objetivo de otimizar a criação de elementos no sistema SCADA, diversas bibliotecas e templates foram desenvolvidos. Essas bibliotecas automatizam desde a configuração da aplicação, até a criação de objetos específicos na tela, incluindo suas propriedades e atributos. Para isso, foram estabelecidas regras de padronização para a criação de fontes de dados, bem como a definição de como esses dados devem ser organizados e extraídos. Com base nisso, metodologias foram formuladas para a criação de configurações de funcionalidades e objetos do sistema, permitindo a modelagem e manipulação dos dados. A partir daí, foram desenvolvidas rotinas computacionais para compor as bibliotecas, automatizando o processo de extração, modelagem e criação de configurações e objetos da aplicação. Essas bibliotecas utilizam como fontes de dados a lista de pontos da planta e os objetos e configurações do próprio sistema. O resultado dessa integração é uma maior eficiência e padronização no processo de criação de elementos no sistema SCADA.


3.1 Padronização da fonte de dados


Para a geração das configurações de forma adequada ao ambiente de desenvolvimento do SCADA, é necessário um padrão nas fontes de dados. Dessa forma, foram definidas uma série de regras para o preenchimento adequado da lista de pontos. Essa lista no formato CSV é a entrada de uma rotina presente na biblioteca. Os dados dessa lista são lidos e através de suas informações todos os objetos de dados são criados e configurados na aplicação de acordo. Isso inclui medições, alarmes, comandos, intertravamentos, históricos, tipos de pontos. Além disso, são criadas e configuradas todos as tags de drivers de aquisição e distribuição, os quais são componentes de software que permitem que um Sistema de Supervisão (SCADA) possa enviar ou receber informações de equipamentos. Esse processo é visto brevemente na Fig. 1.

Fig. 1 - Diagrama de geração

Por meio de uma rotina, ao se definir o caminho e o nome da lista de pontos, os metadados contidos na lista, são transformados em objetos hierarquizados nativos do software SCADA, além de repassar os atributos a estes objetos.


3.2 Configuração da aquisição e distribuição de dados


Os drivers são gerados de acordo com as informações inseridas na lista de pontos, onde é definido se o driver será de aquisição ou distribuição, ou ainda, se o tipo do protocolo de driver será IEC 104, IEC 61850, IEC 101, DNP3, MODBUS, SNMP, OPC ou outros. Além disso, as tags são geradas seguindo uma hierarquia de pastas, originadas a partir da pasta com o nome do Bay, que corresponde a uma área da subestação que abriga equipamentos como transformadores, disjuntores, chaves seccionadoras entre outros dispositivos elétricos, seguido por uma pasta com o nome do IED, e finalmente uma pasta por tipo do ponto. Vale ressaltar que os endereços de cada tag do driver são preenchidos de acordo com o tipo do protocolo e com o tipo do ponto, se é uma medição digital, medição analógica, ou um comando. Na Fig. 2 é possível visualizar algumas tags geradas em um driver de aquisição IEC 61850.

Fig. 2 - Exemplos de tags de driver de aquisição IEC 61850 gerado pelo framework

3.3 Criação de informações de alarmes


As medições e comandos são gerados seguindo a estrutura de Bays e equipamentos da subestação. As medições podem ser de dois tipos, digitais ou analógicas. Além disso, dentro dos objetos de medições, também são gerados alarmes, e um objeto SCADA, responsável por relacionar a respectiva medição, com sua tag no driver, conforme ilustrado na Fig. 3.

Fig. 3 - Exemplos de medições geradas.

Os alarmes gerados possuem o mesmo nome da respectiva medição que estão contidos, além de serem do mesmo tipo do ponto (digitais ou analógicos). É importante salientar que para cada alarme é definida sua severidade, e para os alarmes analógicos são definidos também os limites das faixas operacionais.

Dentro dos objetos de comandos, são geradas unidades de comando, as quais são responsáveis por relacionar o respectivo comando com sua tag no driver. Ainda dentro do comando, é gerado um objeto de Intertravamentos, cujo contém todos os pontos que intertravam o comando, como mostra a Fig. 4.

Fig. 4 - Exemplo de comando e intertravamentos gerados

Ao realizar a geração de comandos e medições, são gerados também os seus tipos, contendo suas respectivas descrições e unidades de medidas para o caso das medições analógicas, como ilustrado na Fig. 5, Fig. 6 e Fig. 7.

Fig. 5 - Exemplo de tipos de medições analógicas geradas.
Fig. 6 - Exemplo de tipos de medições digitais geradas.
Fig. 7 - Exemplo de tipos de comandos gerados.

3.4 Endereçamento dos históricos de bancos de dados


O framework desenvolvido permite a geração dos históricos para serem armazenados em um banco de dados. Além disso, é realizado também o endereçamento dos objetos do histórico com as tags dos drivers gerados, para adquirir os dados a serem armazenados. Na Fig. 8 é possível visualizar alguns dos objetos do histórico gerado, com seus respectivos endereços.

Fig. 8 - Exemplo de histórico gerado.

3.5 Criação de telas


Após a geração das medições e comandos, é possível gerar também objetos em tela com todos os links criados, os quais são os ícones de acesso aos pop-ups do Bay de alarmes e de medições analógicas e discretas, além das estruturas gráficas para demarcação e identificação dos Bays. A Fig. 9 ilustra os objetos criados em tela.

Fig. 9 - Objetos gerados em tela.

Dessa forma, ao realizar a importação dos unifilares, basta organizar os objetos gerados em tela para finalizar a criação da tela do Unifilar Geral da subestação como ilustrado na Fig. 10.

Fig. 10 - Exemplo de Tela do Unifilar Geral gerada.

As bibliotecas e templates também configuram automaticamente pop-ups padronizados de medições digitais e analógicas, comandos, cartões de manutenção, intertravamentos, alarmes entre outros. A Fig. 11 mostra um exemplo de pop-ups de comandos e intertravamentos gerados.

Fig. 11 - Exemplo de pop-up de comando e Intertravamento gerado automaticamente.

4 CONCLUSÕES

Ao analisar os resultados obtidos, ficou claro que as bibliotecas desenvolvidas foram capazes de automatizar a geração e configuração de medições, comandos, intertravamentos, alarmes, drivers, links entre objetos, telas e banco de dados, seguindo as normas estabelecidas e os pré-requisitos de desenvolvimentos estabelecidos pelas equipes de engenharia. Além disso, essas bibliotecas reduziram significativamente o tempo de desenvolvimento, com uma redução de 90% no tempo de configuração típica de uma entrada de linha de transmissão, em comparação com a abordagem tradicional.


As bibliotecas demonstraram seu potencial por meio de contribuições significativas para o sistema elétrico brasileiro, com a implementação bem-sucedida de sistemas SCADA em quatro subestações da rede básica nacional. Atualmente, esses sistemas operam de maneira eficiente, desempenhando um papel fundamental no controle e monitoramento do sistema elétrico do país. Durante esse processo, observou-se uma notável redução nos erros de configuração, graças à adoção das rotinas e procedimentos automatizados.


Além de aprimorar o desenvolvimento dos sistemas SCADA, o desenvolvimento também encurtou consideravelmente os períodos de Testes de Fábrica (TAF) e de comissionamentos. Isso resultou em antecipações de receitas para os stakeholders finais, graças à conclusão mais rápida e eficaz dos sistemas de supervisão, proporcionando vantagens econômicas e operacionais notáveis para o setor elétrico nacional. Esse progresso não apenas reforça a infraestrutura do setor elétrico brasileiro, mas também impulsiona a eficiência e a confiabilidade de suas operações.


Em resumo, a solução implementada tornou o processo de desenvolvimento mais eficiente, menos custoso e aumentou a confiabilidade e padronização do sistema. É evidente que a automação trouxe muitos benefícios aos projetos, reforçando a importância de se investir em tecnologia para melhorar os processos e otimizar as características econômicas e financeiras dos projetos.

5 REFERÊNCIAS

[1] B. R. Hollifield, E. Habibi, D. Oliver e I. Nimmo, The High Performance HMI Handbook: A Comprehensive Guide to Designing, Implementing and Maintaining Effective HMIs for Industrial Plant Operations, Houston: PAS, 2008.
[2] R. Bian e X. Liu, "Design Application and Research of Substation Comprehensive Automation System Based on Smart Grid," In IOP Conference Series: Earth and Environmental Science, vol. 558, no. 5, p. 052039, 2020, August.

[3] Simões, C, Silva, T. P. “Methodology to Automate the Generation of Scada Applications in Electrical Systems”, Cigré-Brasil, XIII SIMPASE, Recife, Setembro 2019.
[4] Sagi, Mihaly & Atlagic, Branislav & Milinkov, Dejan & Bogovac, Bojan & Culaja, Stanko. (2012). High-Performance Distributed SCADA System Architecture. 152-155. 10.1109/MELCON.2012.6196402.