O Impacto da Comunicação entre Subestações nas Filosofias de Proteção
Nota Técnica
Autor: ESC Engenharia
A prática de graduação de relés digitais baseia-se, ainda nos dias atuais, nas filosofias originalmente empregadas na graduação de relés convencionais (eletromecânicos e estáticos), ou seja, parte-se do pressuposto de que os relés numéricos foram desenvolvidos para emular o comportamento desses dispositivos convencionais e que não é possível, para o relé objeto da graduação, conhecer o status operacional dos bays das subestações adjacentes, assim como as correntes e tensões monitoradas pelas proteções circunvizinhas. De fato, para muitas funções de proteção a empregabilidade das filosofias tradicionais ainda é válida, mas com a evolução das primeiras gerações de relés digitais aos IEDs (Intelligent Electronic Devices) é possível atualizar as filosofias agregando robustez e adaptabilidade aos sistemas de proteção de subestações digitalizadas.
Os bays das subestações encabeçam os ramos do circuito elétrico representativo do sistema elétrico de potência sob estudo, de modo que um bay estar em serviço ou fora de serviço significa ter o ramo correspondente fora ou dentro do circuito elétrico, o que impacta diretamente no equivalente de rede “visto” pelo relé sob graduação. A indisponibilidade dessa informação, de acordo com a filosofia de graduação vigente, convencional, exige que o engenheiro de proteção, quando da etapa de cálculo dos níveis de curto-circuito e impedâncias aparentes que subsidiam a graduação das proteções de sobrecorrente e distância, respectivamente, antecipe-se realizando simulações que apontem os piores casos de correntes de defeito, considerando sistema sob a condições íntegra e contingenciada, a fim de propor um ajuste único que atenda todas as condições de operação.
A IEC-61850-90-5:2012 definiu uma versão roteável sobre WAN, com requisitos de segurança cibernética, do protocolo orientado a eventos GOOSE, chamado Routable-GOOSE (R-GOOSE), para estender o conceito de interoperabilidade intra-subestação para IEDs localizados em subestações distintas, viabilizando, assim, a troca bidirecional de sinalizações na WAN, isto é, o protocolo R-GOOSE permite que um dado bay X de uma subestação local troque, de forma bidirecional, informação com um bay Y de uma subestação adjacente. Por exemplo, a sequência de (a) a (c) apresentada a seguir, ilustra um novo paradigma possível na filosofia de graduação da proteção considerando o recurso de R-GOOSEs, disponíveis em sistemas de PAC (Proteção, Automação e Controle) baseados na versão vigente da IEC-61850.
(a) Considere sob análise, como mostrado na figura seguinte, os IEDs dos terminais A e D da LT A-D, inserida em uma rede elétrica em regime permanente com topologia íntegra e com infraestrutura IEC-61850 devidamente implementada na sua segunda edição (protocolo R-GOOSE disponível para troca bidirecional de dados entre subestações).
(b) Com a perda da LT D-E na circunvizinhança dos terminais da LT A-D, conforme apresentado na figura a seguir, suponha que os ajustes das funções 51 (PU51) dos IEDs nos terminais associados às SEs A, F, G e J; adjacentes aos terminais D e E da LT contingenciada (LT D-E), se tornem criticamente sensíveis (ou insensíveis). Por exemplo, para IED do terminal A (SE A), os 2940 A de ajuste não mais garantem a sensibilidade requerida pelo graduador.
(c) Os estudos de graduação da proteção da função 51 dos IEDs das SEs A, D, E, F, G e J, por exemplo, podem considerar a comutação automática de grupo de ajuste desses IED de modo que ao serem recebidas pela vizinhança sinalizações R-GOOSE dos terminais da LT D-E contingenciada, os pick-ups das proteções 51 envolvidas passem de seus valores PU51 a PU51’, os quais PU51’s foram previamente definidos/estudados pelo graduador para garantir sensibilidade para o novo ponto de operação do sistema. Por exemplo, para IED do terminal A (SE A), o ajuste comuta de 2940 A para 675 A, restabelecendo a sensibilidade para a nova operação degradada da rede.
A possibilidade de troca bidirecional de informação entre SEs, via R-GOOSE, amplia as estratégias de graduação, ao agregar “certa” inteligência aos sistemas de proteção, como visto no exemplo da função 51 apresentado. Isso quebra um padrão de filosofia de graduação de relés estabelecido desde os primórdios da engenharia de proteção que era o de não se saber, a princípio, o status das instalações adjacentes. A possibilidade de troca bidirecional de informação entre SEs, via link lógico baseado na edição vigente da IEC-61850, amplia as possibilidades de graduação, ao agregar adaptabilidade aos sistemas de proteção.
SUGESTÃO DE BIBLIOGRAFIA PARA APROFUNDAMENTO:
- TORRENTE, C. D., FORSHAW, A., “Cybersecurity for Shared Infrastructure Substation Networks with IEC 61850 Goose and Sampled Values”, PAC World Magazine, Mar/2019;
- AFTAB, A. M., ROOSTAEE, S., HUSSAIN, S. M. S., ALI, I., THOMAS, M. S., MEHFUZ, S.,“Performance evaluation of IEC 61850 GOOSE based inter-substation communication for accelerated distance protection scheme”, IET Gener. Transm. Distrib., 2018;
- APOSTOLOV, A., “R-GOOSE: What it is and its application in distribution automation”, IET 24th International Conference & Exhibition on Electricity Distribution, 2017;
- FIROUZIA,S. R, VANFRETTIA, L., RUIZ-ALVAREZ, A., HOOSHYARA, A., MAHMOODA, H., “Interpreting and Implementing IEC 61850-90-5 Routed-Sampled Value and Routed-GOOSE Protocols for IEEE C37.118.2 Compliant Wide-Area Synchrophasor Data Transfer”, Journal of Electric Power System Research, 2016;
- KANABAR, M., CIORACA, A., JOHNSON, A., “Using High-Speed and Secured Routable GOOSE Mechanism”, PAC World Magazine, Jun/2016;
- NIEJAHR, J., SCHUSTER, N., SPANGLER, M., “Substation to substation (ss2ss) GOOSE exchange for
critical relay operations”, Cigrè Canada – Conference on Power Systems, Vancouver, 2010; - OLIVEIRA, C. H. R., BOWEN, A. P., “Comunicação de Mensagens Goose na WAN entre Roteadores de Subestações para Teleproteção de Linhas de Transmissão e Dispositivos Elétricos Proporcionando Convergência de Serviços”;